Defesas civis devem investir em profissionalização para enfrentar riscos climáticos
Pesquisa aponta dificuldades de monitoramento e fiscalização da expansão urbana em áreas sujeitas a inundações e deslizamentos, além de equipes reduzidas e falta de recursos financeiros
29 JUN 2025 - 12H00 • Por Luciana Constantino, Agência FAPESP.Com a intensificação dos impactos das mudanças climáticas em áreas urbanas, é essencial aumentar as capacidades de organização das defesas civis para conseguirem implementar a gestão de riscos de desastres, incluindo prevenção e mitigação.
Visando contribuir com esse debate, estudo realizado por pesquisadores do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) traz uma proposta de política pública centrada em cinco frentes.
São elas: profissionalização de gestores e funcionários da área; desenvolvimento de capacidades adaptadas às especificidades regionais e de cada bioma; alocação de orçamento próprio nos municípios; comunicação contínua; e participação social e intersetorial.
Essas ações foram construídas para fazer frente aos maiores desafios apontados pelas próprias defesas civis municipais na implementação das políticas. Entre esses entraves estão dificuldades de monitoramento e fiscalização da expansão urbana em áreas sujeitas a inundações e deslizamentos. Além disso, equipes reduzidas, falta de profissionalização, de recursos financeiros, de participação social e de relacionamento com outras áreas administrativas.
A pesquisa usou dados quantitativos e qualitativos, obtidos por métodos mistos, entre outubro de 2020 e dezembro de 2021. Incluiu questionário on-line respondido por 1.993 dos 5.568 municípios brasileiros, além de entrevistas com 31 representantes de cidades de cinco regiões do Brasil e dez grupos focais virtuais com 260 participantes.
Cerca de 43% dos entrevistados se consideraram pouco qualificados para agir antes dos desastres, patamar parecido com a atuação durante (40%) e depois (41%) do ocorrido. Apesar de mais da metade dizer ser capaz ou muito capaz para avaliar e reportar danos materiais (60%), para identificar e mapear áreas de risco (54%) e para manter a população informada (53%), 61% não utilizam um sistema de alerta precoce e 54% não adotam o inventário de pessoas que vivem em áreas de risco.
Esses resultados estão no artigo ‘Desafios de implementação de políticas de gestão de riscos de desastres: as capacidades organizacionais das unidades municipais de defesa civil’ (Implementation challenges of disaster risk management policies: The organizational capacities of municipal civil defense units), publicado no International Journal of Disaster Risk Reduction.
O trabalho reúne também achados anteriores do projeto Elos – um diagnóstico das necessidades e capacidades dos órgãos municipais de defesa civil feito a partir de 2021 – e dá um passo além, voltado a pensar em soluções para os problemas. Parte dos dados quantitativos do Elos resultou em seis publicações do ‘Diagnóstico de Capacidades e Necessidades Municipais em Proteção e Defesa Civil’
“A intensificação dos eventos climáticos extremos tem levado a um aumento da área de abrangência dos desastres, extrapolando o território municipal e até mesmo as bacias hidrográficas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, 96% dos municípios foram atingidos ou devastados pelas inundações e deslizamentos em maio de 2024, levando o Estado e outras organizações a repensarem a forma de atuação”, avalia o pesquisador do Cemaden Victor Marchezini, autor correspondente do artigo e coordenador do Elos.
“No Brasil, costumamos nos mobilizar quando o desastre acontece. Mas temos de nos preparar melhor e pensar em como aprimorar a coordenação entre os vários órgãos administrativos e da sociedade antes do desastre para que a resposta não seja sempre improvisada.”
Segundo o Atlas Digital de Desastres no Brasil, plataforma da Defesa Civil Nacional, o país registrou cerca de 11.400 ocorrências de alagamentos, enxurradas, inundações, chuvas intensas, tornados, vendavais, ciclones, granizo e movimento de massa entre 2014 e 2024. Foram 63 milhões de pessoas afetadas ao longo da década.
Os cientistas trabalham agora em uma nova coleta de dados com as defesas civis municipais, que vai até o dia 1º de julho, com foco na prevenção, no âmbito do projeto Capacidades Organizacionais de Preparação para Eventos Extremos (COPE). Até o dia 15 de junho, 1.985 municípios brasileiros tinham respondido o questionário completo do Projeto COPE-Cemaden.
Estão sendo investigados aspectos do mapeamento de risco, dos sistemas de alerta, da relação com outros órgãos no município e com diferentes grupos sociais e como lidam com instrumentos de gestão de risco. Há questões que tratam da relação com os planos municipais de adaptação às mudanças climáticas, com fake news e informações repassadas para a imprensa.
O formulário para gestores públicos e integrantes das defesas civis pode ser acessado no link abaixo.
“As políticas brasileiras de gestão de riscos de desastre atribuíram responsabilidades aos governos locais sem avaliar se teriam capacidades organizacionais para tomar as decisões e se coordenar com outros atores. Detectamos que a insuficiência de recursos financeiros e de pessoal e a alta rotatividade dos funcionários, que nem sempre recebem capacitação adequada, têm impacto direto nessa realidade”, diz Marchezini, coordenador do COPE, à Agência FAPESP.
Com informações da Agência Fapesp.
@agenciafapesp
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