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Rota da Fruticultura

Depois do pequi sem espinhos, Embrapa planta açaí irrigado no Cerrado

Estação experimental da Embrapa Cerrados em Planaltina, no Distrito Federal, desenvolve pesquisa para impulsionar o cultivo sustentável do açaí irrigado longe do Pará

21 NOV 2025 - 10H07 • Por Wilson Lopes
Atualmente, a Embrapa Cerrados conduz dois experimentos de campo em uma área de 2,3 hectares: um voltado ao manejo de irrigação e outro à avaliação agronômica e adaptativa - Embrapa Cerrados

O cultivo do açaí, concentrado no estado do Pará, na região Norte do país, desperta crescente interesse nacional e internacional, impulsionado pelo aumento das exportações e pela valorização de suas propriedades nutricionais.

Com o objetivo de produzir mudas do açaizeiro adaptadas ao cultivo sustentável no bioma Cerrado, capacitar técnicos e formar multiplicadores, a Embrapa Cerrados desenvolve em sua estação experimental de Planaltina, no Distrito Federal (DF), uma série de estudos, pesquisas e workshops, que já demonstram resultados animadores.

A ação é um desdobramento das Rotas de Integração Nacional (ROTAS), redes de arranjos produtivos locais associadas a cadeias produtivas estratégicas capazes de promover a inclusão produtiva e o desenvolvimento sustentável das regiões brasileiras priorizadas pela Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR). Entre elas estão as rotas do açaí, biodiversidade, cacau, cordeiro, economia circular, fruticultura, leite, mel, TIC, moda e pescado.

O experimento da Embrapa Cerrados se dá no âmbito da Rota da Fruticultura na Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE-DF), composta pelas regiões administrativas do DF, 29 municípios goianos e quatro de Minas Gerais. 

A troca de experiências entre pesquisa, transferência de tecnologia e extensão foi iniciada em 2022. Para o chefe-geral da Embrapa Cerrados, Sebastião Pedro, a diversificação e a introdução de culturas tropicais de alto valor, como o açaí, é um caminho sem volta. 

Para Sebastião, o Cerrado pode se tornar uma nova fronteira produtiva para essa espécie tipicamente amazônica, de alto potencial econômico, agronômico e nutricional. Contudo, ele ressalta que o cultivo na região apresenta desafios climáticos, pois adaptar uma planta de ambiente úmido às condições locais exige pesquisa, inovação e manejo cuidadoso, mesmo com irrigação.

O pesquisador destacou o caráter colaborativo do projeto, lembrando que, diferentemente do modelo tradicional de pesquisa, em que se estuda antes de plantar, o trabalho com o açaí no Cerrado ocorre de forma simultânea.

Segundo a Rota das Frutas RIDE-DF, a expectativa é de que o ciclo da primeira colheita leve cerca de 4 anos nas propriedades assistidas pelo projeto (Rota das Frutas RIDE-DF)

Pesquisas em andamento

O pesquisador da Embrapa Cerrados Wanderlei Lima destaca que os plantios de açaizeiro na região do DF já são uma realidade, ao mesmo tempo em que se desenvolvem os trabalhos de pesquisa com a cultura. Ele explica que as primeiras mudas plantadas na Embrapa Cerrados já vão completar dois anos. 

Desde então, ressalta, estão sendo produzidas recomendações técnicas que viabilizem a produção sustentável de açaí na região. O trabalho inclui experimentos voltados à definição de sistemas de produção de mudas, manejo de irrigação e monitoramento de doenças e nutrição. Também visa à formação de uma população-base para o melhoramento genético, com o objetivo de desenvolver cultivares adaptadas às condições do Cerrado.

Avaliação agronômica e adaptativa

Conforme o coordenador-geral da Rota das Frutas RIDE-DF, Luiz Curado, a expectativa é de que o ciclo da primeira colheita leve cerca de 4 anos, tanto na estação da Embrapa quanto nas propriedades assistidas pelo projeto no DF, Cristalina, Formosa, Goianésia, Flores de Goiás, Vila Boa de Goiás e Padre Bernardo, que concentram as maiores produções. 

O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR) espera que o projeto do açaí irrigado alcance 1.000 famílias e que o cultivo gere cerca de R$ 250 mil por ano a cada uma delas.

Atualmente, a Embrapa Cerrados conduz dois experimentos de campo em uma área de 2,3 hectares: um voltado ao manejo de irrigação e outro à avaliação agronômica e adaptativa de progênies geneticamente superiores de açaí provenientes do campo de produção de sementes da Embrapa Amazônia Oriental, localizado em Tomé-Açu (PA).

“O estudo busca compreender o comportamento das plantas desde a germinação até o plantio definitivo, avaliando aspectos como substrato para mudas, irrigação e avaliações do crescimento e desenvolvimento, tanto na fase vegetativa quanto na fase reprodutiva”, explicou o pesquisador Wanderlei Lima.

No país, são conhecidas três espécies principais (Euterpe edulis, E. precatoria e E. oleracea). Para Wanderlei, compreender a adaptação dessas plantas às diferentes condições ambientais é essencial para o sucesso da cultura no Cerrado.

Segundo Wanderlei, o trabalho é desafiador, inédito e gratificante, pois representa um legado para a agricultura tropical e um passo importante na consolidação de uma nova fronteira para a cultura do açaí no Brasil.

A Embrapa Cerrados tem promovido ao longo dos últimos anos a capacitação de agentes multiplicadores e produtores rurais na área da Fruticultura Tropical (Embrapa Cerrados)

Cultura promissora

Segundo o pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental João Tomé de Farias Neto, produtor e especialista em açaizeiro, o açaí é uma das culturas mais promissoras e rentáveis da atualidade, com demanda crescente no Brasil e no exterior. Ele adverte que o mercado mundial ainda está longe de conhecer plenamente o potencial do fruto.

Do ponto de vista econômico, o açaí é o segundo produto agrícola mais importante do Pará, ficando atrás apenas da mandioca. O estado responde por cerca de 1,6 milhão de toneladas anuais. Entretanto, o setor enfrenta desequilíbrio entre oferta e demanda: o comércio do fruto cresce cerca de 15% ao ano, enquanto a produção aumenta apenas 5%, o que tem elevado o preço do produto, chegando a R$ 80,00 por lata (14kg) em períodos de entressafra.

O pesquisador explicou que 70% a 80% da produção do Pará ocorre no segundo semestre, o que provoca escassez e encarece o produto no início do ano. A solução, segundo ele, é o cultivo em terra firme com irrigação, que permite escalonar a produção e garantir oferta constante. Ele enfatizou, no entanto, que a irrigação é fator essencial para o sucesso da cultura fora das várzeas. 

Para João Tomé, a migração do açaí das várzeas para a terra firme irrigada é inevitável, tanto na Amazônia quanto em novas regiões produtoras, como o Cerrado e o Nordeste, onde já há registros de produtividades superiores às do Pará. 

“O futuro da cultura está no cultivo tecnificado, irrigado e geneticamente melhorado, capaz de garantir produção contínua, sustentabilidade econômica e ampliação do acesso do açaí ao mercado mundial”, observa.

O caroço do pequi dotado de muitos espinhos, bem pequenos, e a variedade desenvolvida pela Emater/Embrapa, sem espinhos (Ênio Tavares)

Pequi sem espinhos e blueberry

A Embrapa Cerrados tem promovido ao longo dos últimos anos a capacitação de agentes multiplicadores e produtores rurais na área da Fruticultura Tropical. Neste ano, foi lançado o livro 'Fruticultura Tropical – capacitação e experiência de sucesso', que registra a memória dessas capacitações sobre o cultivo de diferentes frutíferas, incluindo o açaí, em regiões tropicais, principalmente no bioma Cerrado. 

Recentemente, a Embrapa Cerrados e a Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e de Pesquisa Agropecuária (Emater) lançaram uma nova variedade de pequi sem espinhos. O trabalho de pesquisa se iniciou há 25 anos, após a variedade ser encontrada na natureza. Daí, as pesquisas de clonagem evoluíram com a propagação de mudas por sementes, estaquia e enxertia.

A Rota das Frutas RIDE-DF também investe na expansão do polo de frutas vermelhas, com destaque para o mirtilo, também conhecido como blueberry. Cooperativas estão sendo assistidas para produzir a variedade Emerald, desenvolvida para exigir menos horas de frio, podendo alcançar até 2,5 kg por planta no segundo ano de plantio e, a partir do 3º ano, a produtividade aumenta de acordo com o manejo correto do produtor. Para esta variedade, o MIDR espera alcançar 100 famílias que poderão gerar, cada uma, R$ 300 mil por ano de renda.

A Rota das Frutas RIDE-DF investe na expansão do polo de frutas vermelhas, com destaque para o mirtilo, com uma variedade desenvolvida para exigir menos horas de frio (Rota das Frutas RIDE-DF)

Rota da Fruticultura

A Rota das Frutas RIDE-DF busca impulsionar o desenvolvimento sustentável da fruticultura no Distrito Federal e região. O projeto trabalha para ampliar a produção e o fornecimento de frutas aos mercados interno e externo, gerar emprego e renda, fortalecer o campo com mais prosperidade, diversificar as culturas e atrair novos agricultores para o setor da fruticultura. 

A Rota atua como o eixo organizador de toda a cadeia produtiva da fruta, reunindo: produtores rurais, grupos comerciais, associações, setor público, governos estaduais, distribuidores, setores de logística, armazenamento, embalagens, entre outros. 

É coordenada pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e desenvolvida em conjunto com a Embrapa Cerrados e a Conab. Também formam essa rede de parceria diversas instituições como o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, a Superintendência Federal de Agricultura do Distrito Federal (SFA/DF), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-DF), a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) e a Organização das Cooperativas do DF (OCDF).

A RIDE é constituída pelo Distrito Federal, pelos municípios de Abadiânia, Água Fria de Goiás, Águas Lindas de Goiás, Alexânia, Alto Paraíso de Goiás, Alvorada do Norte, Barro Alto, Cabeceiras, Cavalcante, Cidade Ocidental, Cocalzinho de Goiás, Corumbá de Goiás, Cristalina, Flores de Goiás, Formosa, Goianésia, Luziânia, Mimoso de Goiás, Niquelândia, Novo Gama, Padre Bernardo, Pirenópolis, Planaltina, Santo Antônio do Descoberto, São João d’Aliança, Simolândia, Valparaíso de Goiás, Vila Boa e Vila Propício, no Estado de Goiás, e pelos municípios de Arinos, Buritis, Cabeceira Grande e Unaí, no Estado de Minas Gerais.

Fonte: Rotas de Integração Nacional

Pará responde por 92,5% da produção

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil produziu 1.741.757 toneladas de açaí, em uma área colhida de 262.289 hectares em 2024. O rendimento médio foi de 6.641 kg por hectare, colhidos em 47.855 unidades rurais. O valor da produção alcançou R$ 7,77 bilhões.

O Pará responde por 92,5% da produção (1.612.142 toneladas), com área colhida de 248.812 hectares (94,8%) em 35.374 unidades rurais (73,9%). 

Com informações de Juliana Caldas, Embrapa Cerrados.
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Acesse o DECRETO Nº 7.469, DE 4 DE MAIO DE 2011 - Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – RIDE>>

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