O IBGE está substituindo a denominação dos “Aglomerados Subnormais”, adotada pelo instituto em seus censos e pesquisas desde 1991. A nova denominação, discutida amplamente pelo instituto com movimentos sociais, comunidade acadêmica e diversos órgãos governamentais, será “Favelas e Comunidades Urbanas”.
Com isso, o IBGE retoma o termo “Favela”, utilizado historicamente pelo órgão desde 1950, junto ao termo “Comunidades Urbanas”, de acordo com identificações mais recentes. Não houve alteração no conteúdo dos critérios que estruturam a identificação e o mapeamento dessas áreas e que orientaram a coleta do Censo Demográfico 2022. Trata-se da adoção de um novo nome e da reescrita dos critérios, refletindo uma nova abordagem do instituto sobre o tema.
“A nova nomenclatura foi escolhida a partir de estudos técnicos e de consultas a diversos segmentos sociais, visando garantir que a divulgação dos resultados do Censo 2022 seja realizada a partir da perspectiva dos direitos constitucionais fundamentais da população à cidade”, diz Cayo de Oliveira Franco, Coordenador de Geografia da Diretoria de Geociências do IBGE.
Entre os fundamentos legais para a mudança está o direto à moradia, considerado um direito humano fundamental desde a Declaração Universal de 1948 e previsto no Art. 6º da Constituição Federal de 1988. Consequentemente, está a previsão de que as pessoas podem mobilizar os meios disponíveis para viabilizá-lo, inclusive a autoconstrução e a ocupação dos espaços da cidade a fim de concretizar sua função social. O direito à moradia adequada também é descrito no Comentário nº. 4 do relatório do Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, publicado em 1991.
Da mesma forma, os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 versam sobre a função social da propriedade e da cidade e sobre o instrumento de usucapião. Destaca-se ainda o Estatuto da Cidade (Lei nº 10 257/2001) e o conjunto de leis que versam sobre a regularização fundiária urbana.
Comunidades Urbanas
A partir de 2003, o IBGE já vinha realizando uma série de atividades de consulta para revisão da nomenclatura. O chefe do Setor de Territórios Sociais, Jaison Luis Cervi, destaca algumas decisões estabelecidas após os processos de consulta. Entre elas está a aceitação unânime do termo favela, que está vinculado à reivindicação histórica por reconhecimento e identidade dos movimentos populares. Foi consensual a necessidade de que o termo estivesse acompanhado de um complemento. Além disso, o conceito deveria ter uma acepção positiva e ser um elemento de afirmação, e não de estigmas, reforçando a sociabilidade, a identidade e as formas próprias de organização desses territórios.
“Também se estabeleceu a importância de que o conceito se refira a territórios com direitos não atendidos, em vez de territórios em desacordo com a legislação. Embora seja central evidenciar a potência desses territórios, foi mencionado o desafio de que a desassistência de direitos seja também evidenciada pelas estatísticas públicas”, diz Cervi.
A partir desses insumos, o IBGE preparou nova proposta de redação dos critérios e selecionou alternativas possíveis para uma nova nomenclatura. Nesse processo, a denominação “Favelas e Comunidades Urbanas” foi a mais aderente às discussões realizadas no decorrer do processo, por ser, inclusive, habitualmente utilizada pelas lideranças comunitárias envolvidas nesse debate. Ressaltou-se a popularidade do termo, especialmente fora da Região Sudeste, e a relevância de um nome fortemente embasado nas práticas sociais e comunitárias desses territórios.
O IBGE está analisando, para a publicação dos resultados do Censo Demográfico 2022, a comparabilidade com os resultados de 2010, identificando os territórios que já existiam e não foram identificados, naquele ano, bem como os territórios que sofreram expansão ou remoção.
1 bilhão de favelados
Segundo projeções da ONU-Habitat 2022, cerca de um bilhão de pessoas vivem atualmente em favelas e assentamentos informais, em todo o mundo. Esse número pode estar subestimado, frente às dificuldades de captação dos dados em diversos países e à dinamicidade de formação e dispersão desses territórios. De acordo com a ONU-Habitat, em 2021, cerca de 56% da população do planeta vivia em áreas urbanas, e essa taxa deve subir para 68% em 2050.
No campo das estatísticas internacionais a respeito das favelas e comunidades urbanas, desde o início do século XXI, um conjunto de esforços, coordenados principalmente pela ONU-Habitat, tem se voltado para a construção de nomenclaturas e parâmetros operacionais globais para a identificação e o mapeamento desses territórios. Os indicadores produzidos para acompanhamento das metas globais associadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, por exemplo, demandam o aperfeiçoamento constante da produção de informações sobre esses territórios.
Com informações Carmen Nery e Vinícius Britto, Agência IBGE.
@ibgeoficial
Confira a reportagem “Favelas e Comunidades Urbanas: IBGE muda denominação dos aglomerados subnormais”>