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21 tipos de polímeros

Microplástico contamina 69,3% das praias brasileiras

Estudo analisa 1.024 praias localizadas em 211 municípios de todos os 17 estados litorâneos brasileiros e o resultado não deixa dúvida: o ecossistema costeiro está ameaçado

27/10/2025 - 12:22 Por Wilson Lopes
Fonte: Microplastic pollution across the Brazilian coastline: Evidence from the MICROMar project, the largest coastal survey in the Global South

Um dos mais extensos levantamentos sobre a ocorrência de microplásticos (MP) nas praias tropicais do Sul Global chegou a uma constatação alarmante: 69,3% das praias brasileiras estão contaminadas.

O estudo coletou 4.134 amostras de sedimentos de 1.024 praias localizadas em 211 municípios de todos os 17 estados costeiros brasileiros, cobrindo aproximadamente 7.500 km de litoral, o que representa mais de 90% de toda a extensão costeira do país.

A seleção do local considerou a cobertura geográfica, a diversidade ambiental e morfológica, o nível de urbanização e a proximidade de potenciais fontes de poluição (terminais portuários, emissários de esgoto, pontos turísticos e empreendimentos costeiros).

O estudo coletou 4.134 amostras de sedimentos de 1.024 praias, cobrindo aproximadamente 7.500 km de litoral, o que representa mais de 90% de toda a extensão costeira do país (Fapeg)

Os pesquisadores consideraram microplásticos os fragmentos medindo de 300 μm a <5 mm, coletados a 5 metros da costa, que foram caracterizados por morfologia, cor, tipo e composição química. Entre 21 tipos de polímeros, os mais encontrados foram polietileno (PE), poliestireno expandido (EPS) e polipropileno (PP), dominados pelas cores branca, verde e azul.

Segundo o estudo, a ocorrência de microplásticos variou amplamente entre os estados (16,5%–90,6%). As concentrações variaram de 0 a 3.483,4 MP/kg, com pontos críticos no Paraná, Sergipe, São Paulo e Pernambuco. Uma linha de base nacional de 27,09 MP/kg foi estimada. 

Para os pesquisadores, a poluição por microplásticos em ambientes costeiros representa uma ameaça significativa à biodiversidade e aos serviços ecossistêmicos, com potenciais implicações para a saúde humana, particularmente no Sul Global, onde dados sobre impactos em larga escala são escassos.

“Modelos preditivos revelaram que o estado, o município, a proximidade com o lançamento de esgoto, rios, urbanização e o Índice de Pressão e Risco Plástico (PPRI) influenciaram significativamente a distribuição de MP. Nossos resultados fornecem suporte científico robusto para esforços de monitoramento e mitigação, oferecendo um dos conjuntos de dados de MP costeiros mais abrangentes do Sul Global”, aponta o relatório. 

Fonte: Microplastic pollution across the Brazilian coastline: Evidence from the MICROMar project, the largest coastal survey in the Global South

Costa Leste, o ‘hotspot’ do microplástico

As regiões da pesquisa foram definidas de acordo com os compartimentos fisiográficos da costa brasileira. Por conta da extensão do litoral, os pesquisadores utilizaram como estratégia a distribuição geográfica da Zona Econômica Exclusiva do Brasil (ZEE), conhecida como Amazônia Azul. Com isso, o estudo resultou em cinco amostras agrupadas representando o Litoral Equatorial Amazônico (342 amostras), Litoral Nordeste (1.991 amostras), Litoral Leste (716 amostras), Litoral Sudeste (777 amostras) e Litoral Sul (304 amostras). 

Conforme o resultado, as concentrações apresentaram forte heterogeneidade espacial, com a Costa Leste identificada como um ‘hotspot’ (16,87 MPs/L), contrastando com as costas Nordeste (6,95), Sudeste (5,25), Sul (3,36) e Equatorial Amazônica (1,29), refletindo a influência combinada de pressões antropogênicas e fatores oceanográficos.

Na região equatorial amazônica, gradientes de baixa salinidade, altos níveis de clorofila e aumento da velocidade da água superficial associados à pluma fluvial e à deriva litorânea sugerem bioagregação e exportação para camadas subsuperficiais, consistentes com um regime dissipativo. 

No Leste, maior salinidade, pH elevado, clorofila a reduzida, direção e período de onda, indicando dispersão limitada e células retentivas, combinados com a proximidade de saídas de esgoto e rodovias, favoreceram a acumulação regional.

No Nordeste, ventos alísios persistentes e a orientação das ondas de E–NE intensificaram à deriva litorânea ao longo de estruturas costeiras rígidas, elevando as concentrações.

No Sudeste, a ressurgência sazonal, os gradientes termohalinos e a engenharia costeira modularam a retenção. 

No Sul, a exposição mais ampla à plataforma e os períodos de ondas mais prolongados favoreceram a renovação, enquanto distâncias maiores das fontes pontuais atenuaram as cargas. 

Ao nível nacional, os resultados ressaltam que a poluição por plástico não é uniforme e as estratégias de mitigação devem considerar os distintos regimes de retenção e dissipação entre as macrorregiões. Paralelamente, observou-se um gradiente morfométrico, com partículas maiores e mais degradadas nas regiões mais contaminadas e partículas menores, compactas e intactas nas menos contaminadas.

As amostras foram analisadas no Laboratório de Toxicologia Aplicada ao Meio Ambiente (IF Goiano, Campus Urutaí), distante 900 km da praia mais próxima (Santos/SP) - Freepik

900 km da praia mais próxima

O artigo ‘Microplastic pollution across the Brazilian coastline: Evidence from the MICROMar project, the largest coastal survey in the Global South’ foi publicado pela revista científica ‘Environmental Research’, em sua edição 286. 

Fruto do Projeto MicroMar, aprovado em chamada do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - (chamada CNPQ/MCTI-FNDCT CT-PETRO nº 43/2022), com o aporte de R$ 1.015.000,00 para o custeio das expedições de campo, aquisição de reagentes e equipamentos, o estudo foi coordenado pelo Instituto Federal Goiano (IF Goiano), que recebia as amostras e transportava para o Laboratório de Toxicologia Aplicada ao Meio Ambiente (IF Goiano, Campus Urutaí), distante 173 km de Goiânia, capital do Estado, e 900 km da praia mais próxima (Santos/SP).

O documento também é assinado pela Universidade Federal de Uberlândia, Instituto Singular - Ideias inovadoras (ISII, Rio de Janeiro), Instituto Federal do Ceará, Universidade Federal de Pernambuco, Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Universidade Federal Fluminense, Universidade Estadual do Amapá, com contribuição internacional da Universidade de Alcalá (Espanha), Universidade de Oklahoma (Estados Unidos), Universidade de Guanajuato (México) e Instituto Argentino de Oceanografia.

Coordenado pelo professor Guilherme Malafaia, do IF Goiano, o projeto contou com a participação de bolsistas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg), como o doutorando Thiarlen Marinho da Luz. 

“O investimento vai além da formação individual; representa a aposta do estado em jovens pesquisadores capazes de enfrentar desafios ambientais de escala global”, afirma.

A Fapeg investe cerca de R$ 3,9 milhões no edital que apoia doutorandos de excelência, com bolsas de até R$ 7 mil mensais por três anos. Para o professor Guilherme Malafaia, o MicroMar é um marco para a ciência goiana, nacional e global. O professor destaca que o trabalho preenche uma lacuna histórica na compreensão da poluição por microplásticos nas praias brasileiras. 

“Mesmo sem litoral, Goiás demonstrou capacidade científica e organizacional para liderar a maior investigação costeira já realizada no Brasil. Isso evidencia a maturidade da ciência feita no interior do país”, comemora.

Além do artigo científico, o MicroMar prepara um relatório técnico para o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e as secretarias estaduais de meio ambiente, além de expandir o monitoramento para regiões insulares e estuarinas. O objetivo é consolidar um banco de dados nacional sobre microplásticos e aproximar ainda mais ciência, governo e sociedade. 

“Traduzir o conhecimento científico em soluções práticas é o caminho para reduzir a poluição plástica e preservar os ecossistemas costeiros”, conclui Malafaia. 

Com informações da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás.
@mmeioambiente @ifgoiano @fapegoias @governogoias @wow_thiarlenluz

Acesse o artigo ‘Microplastic pollution across the Brazilian coastline: Evidence from the MICROMar project, the largest coastal survey in the Global South’>>

Acesse o Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar (PNCLM)>>

Assista ao documentário Planeta Plástico (Raíssa de Oliveira Ferreira)>>

 

 


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